Discurso de Sonia Bone Guajajara (APIB), em conferência de imprensa na Royal Society de Londres (24/10/2017):

Se existe floresta em pé, é porque nós ainda existimos

Nós, Povos indígenas, somos os guardiões dos bosques, das águas, dos mares, dos rios e do ar. Se existe floresta em pé hoje é porque nós ainda existimos. Estamos sendo brutalmente atacados pelas forças e ganância do agronegócio e do modelo de desenvolvimento econômico que foi inventado aqui no Reino Unido. Vocês precisam entender que se não há florestas não há economia que resista.

À violência que tentou nos extinguir, pelo crime de genocídio, nós resistimos. À violência que tentou destruir nossa cultura, nossa forma de viver, nosso sentido de existência, nós enfrentamos o etnocídio. 

Desviamos das balas dos pistoleiros, e mantemos a nossa cultura com a força dos espíritos. Mas querem destruir a vida toda que nos cerca, a vida com a qual convivemos e nos permite viver: o crime de ecocídio deve ser previsto em lei, e seus autores devem ser punidos.

E tudo isso tem a ver com a sua forma de consumo.

A carne que você come na sua casa vem dos conflitos e assassinatos contra nosso povo;

A ração do seu cachorro vem da soja produzida com agrotóxico nos Territórios indígenas;

O delicioso chocolate tem sabor de sangue porque custa vidas nos confrontos nas fazendas de cacau.

Não falamos mais só da violência contra humanos, o genocídio e o etnocídio. Mas também da violência contra a vida de outras espécies que fazem possível a nossa vida existir, a violência contra os ambientes que impedem a vida de quem convive com esse ambiente. 

A destruição do Rio Doce não foi um acidente. Foi um crime, e não foi o único: o crime de ecocídio, o crime de matar toda a vida e a possibilidade da vida. 

A Terra Indígena Pankararu e Entre Serras, esta do Povo Pankararu, em Pernambuco, está em grave conflito com pessoas que indevidamente ocupam esse Território em descumprimento à decisão judicial, o que tem colocado em risco a vida dos indígenas. 

Neste fim de semana, um jovem e uma criança Pataxó na Bahia foram mortos e um foi baleado em conflito pela disputa de Terra.

A Terra Indígena Jaraguá do povo Guarani teve sua demarcação anulada pelo presidente Temer. A atual destruição do planeta nos remete à brutal destruição da humanidade que chocou o mundo depois da Segunda Guerra Mundial. Para combater tudo isso é preciso que a Comunidade Europeia e as instâncias internacionais:

1 – Reconheçam e adotem os Direitos da Mãe Terra, considerando os Direitos originários dos povos indígenas. Não é possível existir florestas se não tiver Demarcação Já!!

2 – Embargos econômicos às empresas que produzem produtos que acabam com o meio ambiente e com as nossas vidas;

3 – Reconhecimento do crime de ecocídio. Aquele que desmatar, poluir rios, lagos, mares e oceanos, construir hidrelétricas sem consentimento e vendidas como energia limpa, e práticas de incêndios florestais, deve ser punido por crimes contra a humanidade.

Sônia Guajajara – APIB

Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB)

Declaração da Aliança dos Guardiões da Floresta